Sellano, Luís

pdf

Sellano, Luís

(1968 – )

Luis Sellano é o pseudónimo do autor Oliver Kern, autor nascido em Esslingen am Neckar. Reside atualmente em Estugarda, onde trabalha na área do marketing, mas também na ilustração. Escreveu, desde 2016, sete romances policiais cuja ação se situa em Lisboa – sob a designação de. A partir de 2018 inicia a publicação de uma outra série de policiais, desta feita sediada na sua terra natal bávara. A unidade da série lisboeta reflete-se na utilização de um título genérico para a série: “Um crime em Lisboa” [Ein-Lissabon-Krimi], mas também a utilização do mesmo adjetivo relacional de nacionalidade: “português/portuguesa”.

A série de Lisboa baseia-se na atividade de Henrik Falkner, ex-polícia alemão, que herdou de um tio que nunca conheceu, Martin Falkner, uma loja de alfarrabista e o respetivo prédio na Rua do Almada. Reconhece-se aqui uma origem semelhante ao do romance Portweinerbe de Paul Grote, (vd. Paul Grote nesta base de dados). Os volumes costumam sair ntes das férias, o que leva alguns críticos a considerarem estes romances como ‘policiais de férias’ (Urlaubskrimis, vd p.e. Peter Schwarz), para que os leitores os comprem antes de irem para férias e como uma espécie de guias para a cidade que pretendem visitar, o que levou um crítico a falar de “Cityguide-Hatz” [A confusão de um cityguide]. A editora Heyne publica sempre uma fotografia colorida de Lisboa e coloca mapas com indicações dos espaços referidos em texto. Os quatro primeiros volumes apresentam dois mapas da cidade e em alguns casos mesmo com referências a locais mais distantes da capital, um em cada capa interior. Os volumes cinco e sete só têm um mapa, na capa interior inicial, o volume seis substitui os mapas das capas interiores por duas receitas: ‘Vitela `Lisboeta’ e ‘Favas com Coentros’, mas incluindo um mapa mais pequeno numa das páginas iniciais. Neste volume todos os capítulos iniciam-se com uma receita da cozinha portuguesa com o título “Menu do dia”, em português e em alemão (por exemplo: “Menu do dia: Feijoada com polvo, Espetadas e Suspiros” (vol. 6, p. 11) É de notar que todos os volumes com fotografias nas respetivas capas apresentam o céu azulado, mas sempre com nuvens. Como o espaço lisboeta, a Baixa, não é muito grande, nota-se uma diminuição progressiva das descrições dos locais, ficando-se pelas referências topográficas para evitar repetições para os leitores fiéis à série. Assim o último volume não servirá muito de guia, apesar das referências espaciais estarem assinaladas no mapa. O autor manifesta o seu conhecimento de Lisboa, transmitindo-o ao leitor, assim como os seus próprios gostos culinários, sabendo-se que não gosta de bacalhau e é grande apreciador de vinho verde e de pastéis de nata, como aparentemente o próprio autor.

A série, cuja ação se situa no presente recente, como o atestam as diferentes referências históricas, é apresentada por um narrador na terceira pessoa, com um mais saber, ainda que siga essencialmente a perspetiva da figura principal e por vezes seguindo também as perspetivas de figuras secundária, nomeadamente a de Helena Gomes, agente da polícia.

Henrik nada sabe do mundo dos alfarrabistas, mas quer saber a razão da morte do tio e do seu amante João, assassinado muitos anos antes. Martin interessava-se por crimes não resolvidos e deixava pistas enigmáticas escondidas nos mais diferentes sítios da loja. O prédio é habitado por pessoas de poucas posses e não são grande fonte de rendimento. Henrik só consegue manter a loja aberta, porque a família nortenha do João continua a pagar, com a condição de que ele não abandone a pesquisa sobre a morte do familiar. Entretanto o alemão, como é referido várias vezes nos textos por algumas figuras secundárias, colabora com a agente da polícia Helena, cuja relação vai evoluindo de volume em volume. Deste modo, os volumes vão ganhando uma certa unidade, uma vez que as ações, ainda que independentes, se interligam de algum modo, através da recorrência das mesmas figuras e de alguns locais, facilitando o posicionamento do leitor.

Uma vez chegado à capital portuguesa, Henrik vai conhecendo a pouco e pouco os diferentes recantos de Lisboa, quer os mais turístico quer os que estão mais ao abrigo das massas de visitantes. Cedo se vê envolvido em situações adversas, sempre a partis de pistas que o tio deixara enigmaticamente espalha pelo seu estabelecimento e com a ajuda da agente policial Helena e, nalguns volumes, do Padre Bruno. Através dessas ações vai percorrer a cidade e alguns arredores e conhecendo muitos portugueses e também alguns costumes e, evidentemente, alguns aspetos da gastronomia, incluindo no volume 6 (“Destino Português” [Portugiesisches Schicksal] duas receitas, “Vitela à lisboeta” e “Favas com coentros”.

Através destas histórias, que seguem o esquema tradicional dos policiais centrados à volta de um investigador amador, o autor insere-se largamente no policial ligado ao turismo, com muitas informações locais, incluindo nomes e situações políticas para enquadrar as ações nos respetivos contextos temporais. A inclusão dos mapas com as referências aos locais da ação podem ajudar o leitor, completando as informações que têm dos seus guias.

 

Passagens

Portugal, Alemanha

 

Citações

Do volume 1 “A herança portuguesa”(Portugiesisches Erbe):

“Henrik precisou de uns dez passos na Rua do Almada para reparar que estava completamente só na rua. As muitas pessoas que o rodeavam há poucos segundos ficaram nas ruas de intenso comércio e com elas a multidão, o ruído das mil vozes, até o calor. Algo que o fez pensar. Nesta ruazinha não havia lojas que atraíssem pessoas ou então coisas dignas de serem vistas. Quem frequentava este caminho poderia querer ir até ao miradouro de Santa Catarina ou até ao Museu da Farmácia, pois havia no início da rua indicações. Não havia trânsito de passagem. Mesmo assim os automóveis estavam estacionados de para-choques quase encostados.” (p. 28-29)

“Seja como for, a pequena marcha deu-lhe jeito. A pé bastavam poucos minutos para chegar ao quarteirão dos cafés. Nas pequenas ruas da parte histórica da cidade, poupadas pelo terramoto de há 260 anos, vibrava a vida noturna, confirmando a informação. A disposição despreocupada que as pessoas com que se cruzava, depois do trabalho, sentavam-se nos restaurantes e cafés, comiam, conversavam, dançavam … viviam … o que era contagioso. A mesma ligeireza, que já detetara nas margens do Tejo, voltou agora a senti-la. Apesar de tudo o que acontecera nas últimas horas, sentia-se muito bem.” (p. 74)

“Henrik sabia tratar-se da música portuguesa mais significativa – o fado, o que significava destino. Estas canções narravam sobretudo histórias de amores infelizes, de injustiças sociais de tempos passados ou do desejo de uma vida melhor. Até agora tinha ouvido inconscientemente a música melancólica mas simultaneamente viva, prestava agora que a ouvia uma maior atenção.” (p.78)

Do volume 2 “A vingança portuguesa” (Portugiesische Rache):

“Nunca tinha pensado em como seria o outono em Lisboa. O verão tinha passado, sem que tivesse dado conta. Para além do tempo ser agora mais inconstante e os dias de outubro serem mais pequenos, ainda era quente durante o dia – mas o calor cansativo já tinha passado. Depois do pôr-do-sol era aconselhável um casaco se se quiser sentar-se no exterior, tal como de manhã antes do sol passar a colina.” (p.38)

“As pastelarias eram pequenos mundos em si, feitos para facilitar a vida – sobretudo para a adoçar. Nas vitrines e nas montras viam-se para além dos famosos pastéis de nata, também as tartes de amêndoa, bolos de arroz ou mil-folhas. Já os tinha provado todos, mas eram demasiados doce para o seu gosto. Por isso contentavam-se com o seu galão, o leite com café português, acompanhada de uma torrada.” (p.39)

“Depois de Henrik ter comido o seu pão, pagou e saiu para o sol. A cidade acordava aos poucos, os primeiros turistas apareciam. Na paragem do elétrico já se amontoava uma quantidade de pessoas de pele branca à espera do 28, para darem a volta à cidade de uma maneira especial. Da Praça Luís de Camões já se ouvia o resvalar e o chiar dos rodados. Pôs as mãos no bolso e avançou na calçada branca da grande praça que tinha no meio um monumento do poeta.! (p.49)

Do volume 3 “Lágrimas portuguesas” (Portugiesische Tränen):

“Estou?”. Era a maneira portuguesa de se anunciar – estou – mas um verdadeiro português não usa a vogal no início, começa com um sibilante, que termina num longo uuuuu.” (p.39)

“Depois do Convento do Carmo, com a ruína impressionante da igreja conventual, sem teto, de que só restam as ogivas góticas a rasgarem o céu, seguia um atalho até ao famoso Elevador de Santa Justa. O elevador histórico era o caminho mais rápido para a Baixa. Pelo menos teoricamente. Na prática funcionava como um íman para os turistas e estava sempre a abarrotar.” (p.149)

Do volume 4 “Sangue português” (Portugiesisches Blut):

“O Padre Bruno perseguia a pista do azulejo com tanto afinco, como se esperasse algumas respostas pessoais. O padre lutava também com os demónios do seu passado, que não se resolviam somente com a fé e a bênção divina.” (p. 56)

“Bruno pegou na chávena de chá e bebeu um golo. “Com certeza que tens uma ideia errada. Por mim, acho que os azulejos com valor histórico já andam por aí, mudando de donos. Repara que o nosso país sofreu durante quarenta anos sob o Estado Novo. O povo simples nada tinha e dependia durante a vigência da ditadura, do agarrar-se a tudo o que pudesse para sobreviver. Para muitos era mesmo sobrevivência pura e dura. O que é que lhes importava nessa situação os tesouros artísticos?” (p.61)

“Após um quarto d hora chegou ao Ovos Moles, numa rua discreta numa subida bastante íngreme que afastava os turistas, especialmente em dias de calor. Já chegava a rua comercial que vinha da Baixa até ao Largo do Chiado e o conhecido café A Brasileira com a estátua de Fernando Pessoa mesmo à frente.” (p.86)

Do volume 5 “Verdade Portuguesa” (Portugiesishe Wahrheit):

“Infelizmente os restaurantes do lado oriental da praça ocupavam cada vez mais espaço para servirem no exterior. Para além disso e por causa da onda de calor as árvores palissandros deixavam as folhas ao dependuro. A falta de água não permitia aos responsáveis regar convenientemente esses espaços. Possivelmente também se iria diminuir o consumo doméstico.” (p.48)

Do volume 6 “Destino Português” (“Portugiesisches Schicksal):

“Nada mudou nos arruamentos junto à muralha alta e massiva do Castelo de São Jorge. Porque a colina com o imponente castelo construído pelos mouros atraía milhares de turista todos os anos foram feitos muitos esforços para a preservação do seu lado melhor. Quase todas as construções que aqui se alinhavam tinham sido renovadas ou reconstruídas. Também o restaurante Pôr do Sol fora pintado de novo com a tradicional cor ocre, que agora estava a viver uma espécie de renascimento.! (p.25)

Do volume 7 “O Veneno Português” (Portugiesisches Gift):

“Saudade, uma palavra melancólica, que em português reúne conceitos como saudade, melancolia, tristeza e nostalgia e que era cantado ardentemente em milhares de canções do fado. Um sentimento de dor universal, que se espelha profundamente na própria cidade, porque o seu desequilíbrio interior não poderia ser melhor compreendido do que na metrópole do Tejo.” (p.198)

“Assim ela [Helena] dirigia-se hoje para um dos locais no quarteirão, aqui onde as rajadas do Atlântico sopravam sem serem travadas por cima dos telhados. Claro que ela nunca teria tido a ideia para ir ao Miradouro de Santa Lúcia ou às Portas do Sol, onde andavam diariamente centenas de pessoas, a maioria turistas ou outros visitantes de fora.” (p.192)

 

Bibliografia Ativa Selecionada

Sellano, Luis (2016), Portugiesisches Erbe, Heyne Verlag, München.
Sellano, Luis (2017), Portugiesische Rache, Heyne Verlag, München.
Sellano, Luis (2018), Portugiesische Tränen, Heyne Verlag, München.
Sellano, Luis (2019), Portugiesisches Blut, Heyne Verlag, München.
Sellano, Luis (2020), Portugiesische Wahrheit, Heyne Verlag, München.
Sellano, Luis (2021), Portugiesisches Schicksal, Heyne Verlag, München.
Sellano, Luis (2022), Portugiesisches Gift, Heyne Verlag, München.

 

Bibliografia Crítica Selecionada

Schwarz, Peter (2017), “Spiegel Bestseller:Luis Sellano mordet wieder”, ZVW Digital Wochenblatt, 01.06.2017 (visto em 1 de abril de 2022).
Jenkner, Lukas (2016), “Luis Sellano: ‘Portugiesisches Erbe’. Cityguide-Hatz mit bösen Buben”, Stuttgarter Zeitung, 02.07.2016 (visto em 1 de abril de 2022).

Gonçalo Vilas-Boas

Como citar este verbete:
VILAS-BOAS, Gonçalo (2022), “Luís Sellano”, in Ulyssei@s: Enciclopédia Digital. ISBN 978-989-99375-2-9.
https://ulysseias.ilcml.com/pt/termo/sellano-luis/